Restos recuperados por noruegueses do Kursk. O secretismo em ambos casos deixou intrigado o mundo. |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
A história do submarino russo AS-12 “Locharik” que pegou fogo tem algo de filme de terror, mas está envolta nas brumas misteriosas da “guerra da informação”.
Ficou fora de dúvida que esse submarino nuclear era um navio espião.
Foi feito pela Rússia para interceptar informações que transitam pelos cabos oceânicos intercontinentais – civis e militares, escreveu “O Estado de S.Paulo”.
Também pode mapear o fundo do mar procurando jazidas minerais e até agir em operações de resgate.
Porém um mistério sinistro, tal vez ficou enterrado para sempre no mar de Barents ou em algum escritório do Kremlin. O “Locharik” foi feito mesmo para vigilância avançada, coleta de dados de inteligência, leia-se espionar ou até sabotar nervos decisivos de comunicação.
Ele trabalha para a GU, principal agência da Defesa na rede russa de informações. Os 25 tripulantes são todos oficiais especializados.
O navio é secreto e fica preservado da curiosidade na base naval de Severomorsk. Desloca 2 mil toneladas e mergulha até 6,1 mil metros, bem mais que seus colegas de combate.
A propulsão é nuclear, tem 70 metros de comprimento e pouco menos de 7 metros de circunferência. Pode ser acoplado a um grande submarino de ataque Delta-3 e ser carregado até a área de atuação.
No Mar de Barents, onde um incêndio matou 14 dos 25 tripulantes, há um emaranhado de linhas-tronco de comunicações mantidas por vários serviços públicos e comerciais ocidentais.
Parte do complexo usa sistemas de fibra ótica e luz laser e é dedicado a organizações militares, como o Pentágono.
A NASA também recebe e transmite instruções estratégicas por meio desses canais digitais.
Segundo um analista da Rand Corporation, o “Locharik” só precisa estar próximo dos cabos e ativar dispositivos internos para captar suportes eletrônicos das mensagens. Sem nenhum contato físico.
Proporções do Losharik (AS-12). |
Esse gigante das profundidades, repleto de armas atômicas, afundou em agosto de 2000 com 118 tripulantes. Dezenas deles poderiam ter sido salvos se Putin não recusasse a oferta de ajuda ocidental.
Mas essa foi negada por “secreto de Estado” e os cadáveres de 23 marinheiros recuperados por mergulhadores noruegueses um ano depois patentearam a patética realidade.
Eles sobreviveram num compartimento para emergências emitindo sinais de auxilio durante 48 horas e só morreram pela recusa do socorro do comando russo.
O ministério de Defesa atribuiu a morte dos submarinistas do “Locharik” à inalação de fumaça tóxica, acrescentando que o acidente aconteceu em águas territoriais russas, noticiou a agência France Press.
O ministério também afirmou se tratar de um submarino de pesquisa do meio ambiente dos fundos marinhos, informação que depois se revelaria suspeitamente incompleta.
As contradições das autoridades de Moscou foram se multiplicando ao longo dos dias como numa novela do gênero de Drácula ou de fantasias perversas.
O submarino teria voltado à base fechada de Severomorsk, a mesma de donde partiu o Kursk para não voltar, na região de Murmansk.
Segundo os jornais russos RBK e Novaïa Gazeta, o “Locharik” poderia descer até 6.100 metros de profundidade.
Segundo o jornal online russo “Open Media” e o diário “Vedomosti”, o fogo não pegou nesse submarino, mas num outro, aliás nuclear, que o transportava. “Open Media” avança os nomes dos submarinos Orenburg e Podmoskovié.
Esses imensos cetáceos de aço e morte dependem da Direção de Imersão Profunda (GUGI), uma divisão especial da Marina russa.
Localização da base de Severomorsk no Ártico russo, onde estaria o submarino acidentado. |
“Era uma lotação altamente qualificada”, acrescentou o presidente.
Decididamente, observou France Press com base nas próprias palavras de Putin, esse não era um submarino em missão científica, mas tinha um objetivo estratégico confiado a homens preparados para missões delicadas.
As qualificações da tripulação foram confirmadas pelo porta-voz do Kremlin, noticiou “El Mundo” de Madri.
Putin confirmou posteriormente que se tratava de um submarino “especial”. As condecorações póstumas foram de extraordinária relevância.
Também para o jornal espanhol, “a presencia de vários oficiais de alto rango a bordo sugere que o submarino não estava numa missão ordinária”.
O jornal “Kommersant” acresce que os tripulantes pertenciam à base naval 45707 estabelecida em Peterhof, cerca de São Petersburgo.
O secretismo oficial evoca a tragédia do submarino nuclear Kursk, joia da frota russa do Norte.
O ministro de Defesa, Serguei Shoigu, foi a Severomorsk, área militar de acesso restringido no Ártico, e fez o panegírico dos marinheiros mortos.
Mas nem soube dizer qual era seu número nem o nome do submarino enquanto a imprensa oficial falava de um submergível ultrassecreto de propulsão nuclear.
O secretismo e as imprecisões de dados e declarações levaram à mídia a se perguntar o que é que a Rússia está ocultando desta vez, escreveu “Clarín”.
Base de Severomorsk onde estaria o submarino acidentado. |
Se cortados, produzir-se-ia um blackout das informações de todo tipo e o Ocidente ficaria de joelhos diante de um eventual atacante.
Os EUA e funcionários militares ocidentais vem protestando publicamente pelo desenvolvimento russo de novas e secretas maneiras de intervir nos cabos transatlânticos submarinos de fibra óptica de internet e até corta-los.
Outros temem que o “Locharik” pudesse estar mexendo com a rede de sistemas acústicos no fundo dos mares que a NATO montou para rastrear submarinos ou cabos secretos.
Em 2018, os EUA acusaram Moscou de “rastrear cabos de comunicações submarinos” e impôs retaliações econômicas a uma empresa que fornecia equipamentos para trabalhar em profundidade ao Serviço de Segurança Federal da Rússia.
Porém, mais uma vez, concluiu o jornal espanhol, o Kremlin não está disposto a falar nem a fornecer explicações.
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