domingo, 10 de maio de 2020

O Rasputin de Putin

'Slava' está na execução dos segredos sujos de Putin
'Slava' está na execução dos segredos sujos de Putin
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs





“Machiavel russo”, “marionetista do Kremlin”, ou, mais sugestivamente, “Rasputin de Putin”, são os apelidos com os quais é conhecido Vladislav Surkov, ou ‘Slava’, o conselheiro mais influente da camarilha fechada do Kremlin, escreveu a revista francesa L’Express.

Seus próximos dizem que é um ideólogo “brilhante, cínico e manipulador”, indispensável ao sistema, comenta Macha Lipman, analista do Centro Carnegie.

“Se Putin está tão solidamente ancorado no poder por onze anos, deve-se em grande parte à inteligência e à ausência de escrúpulos de ‘Slava’”.

A Duma — o Parlamento — não é senão uma câmara de aprovação das decisões do Kremlin, onde só a decisão presidencial vale. E Slava cuida para que tudo seja executado segundo as instruções vindas de cima.

Surkov/‘Slava’ é o doutrinador da “democracia dirigida”, eufemismo para designar o regime autocrático atual, enquanto se fala do retorno a um “czarismo” não tradicional na pessoa do todo-poderoso Putin.

“Nossa democracia tem algo de teatral”, admite Boris Nadejdine, um dos líderes do partido liberal “à europeia” Justa Causa, que não está representado na Duma.

“O pluralismo é fictício e as sete agrupações políticas representadas são teleguiadas em graus diversos a partir do Kremlin. Seus líderes devem prestar regularmente contas a Surkov/‘Slava’.”

“Surkov define a intensidade de oposição que o Partido Comunista oferecer ao poder do Kremlin em combinação com Guenadi Ziuganov, o dirigente ostensivo do PC, explica Alexeï Kondaurov, antigo general do KGB. Em função disso Ziuganov modera suas críticas e não organiza manifestações de rua. Em troca, o financiamento do partido está assegurado”.

'Slava' teria ordenado a ação assassina dos snipers durante a tentativa de repressão de Maidan na Ucrânia.
'Slava' teria ordenado a ação assassina dos snipers
durante a tentativa de repressão de Maidan na Ucrânia.
A mesma troca de bons serviços acontece com o líder nacionalista Vladimir Jirinovski, cujo ativismo é inversamente proporcional ao aumento de seu patrimônio.

Aqueles que se não obedecem são marginalizados ou morrem de modo suspeito, como Boris Nemtsov, ex-vice-primeiro ministro de Iéltsin.

O Tribunal Eleitoral se recusa a registrar partidos “trapalhões” que ficam sem existência legal e incapacitados de participar nas eleições.

Para L’Express, trata-se do mais puro Kafka, mas é a Rússia de Putin.

O Kremlin controla todas as TVs, nas quais não entram nem figuras opositoras como Gary Kasparov, ex-campeão mundial de xadrez. Mikhail Kassianov [primeiro ministro de 2000 a 2004], o novelista Eduardo Limonov e eu mesmo somos afastados dos microfones”, relatou Nemtsov antes de ser morto de modo suspeito numa ponte perto do Kremlin.

Desde 2005 os governadores das regiões são nomeados pelo poder central, e não mais eleitos.

‘Slava’ pode criar movimentos políticos do nada e depois destruí-los, como foi o caso do Partido dos Aposentados, criado em 2003 para atender as queixas dos idosos e logo depois afundado.

O oligarca Mikhail Prokhorov assumiu a direção do partido Justa Causa, mas não prestava contas a Surkov e criticava os amigos de Putin.

'Slava' é o mago de todos os conchavos políticos na Duma a serviço de seu patrão, rotando nos cargos na fidelidade ao omniarca
'Slava' é o mago de todos os conchavos políticos na Duma a serviço de seu patrão,
rotando nos cargos na fidelidade ao omniarca
Em cinco meses ele foi deposto e apareceu furioso na TV dizendo que “há neste país uma manipulação de marionetes que privatiza o sistema político e engana nossos dirigentes. Seu nome é Vladislav Yurevitch Surkov!”.

Slava’ requinta seus jogos verbais. Ele declarou à TV chechena: “Estou sinceramente convencido de que Putin foi enviado por Deus à Rússia para ajudá-la num momento difícil, para nosso maior bem”.

Certa vez — conforme relatou Anatoli Iermolin, ex-deputado pró-Putin —, contra toda lógica, ‘Slava’ ordenou a um grupo parlamentar que aprovasse a construção de um oleoduto ao longo do lago Baikal. Os parlamentares lhe imploraram quase de joelhos que renunciasse a essa loucura que suscitaria revoltas na região de Irkutsk.

Após semanas de controvérsia, Putin anunciou que o oleoduto passaria pelo local mais simpático. Então todos compreenderam que havia sido uma mera jogada de ‘Slava’ para promover a popularidade de Putin.

O “Rasputin de Putin” criou com jovens simpatizantes de Putin o movimento ultranacionalista “Os Nossos”, o qual é formado por dezenas de milhares de simpatizantes e um núcleo duro de “barras pesadas” regados com muito dinheiro.

A finalidade é intimidar a oposição, tomar conta das ruas e impedir pela força qualquer protesto popular, notadamente por ocasião de eleições.

É a tropa de choque nova monarquia, na qual Putin está coroando a si próprio.


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