quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Declaração de Havana:
vitória do Kremlin será efêmera

Símbolo da perseguição religiosa na Crimeia que não podia ser ignorada pela Declaração de Havana
Símbolo da perseguição religiosa na Crimeia
que não podia ser ignorada pela Declaração de Havana
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




continuação do post anterior: Hoje como ontem, a Ostpolitik corteja o anticristo moscovita



Dom Sviatoslav lembrou que Moscou deblatera contra o notável progresso do catolicismo na Ucrânia como sendo uma indevida “expansão no território canônico do patriarcado de Moscou”.

Para o simples fiel essa posição soa como se o mundo eslavo fosse um coto fechado onde só podem existir os seguidores do patriarca e de seu chefe Putin.

Lembrou ainda que na “Federação Russa, hoje não temos possibilidade alguma de existência livre e legal, nem mesmo no território anexado da Crimeia, onde somos ‘re-registrados’ em conformidade com a legislação russa e onde de fato somos aniquilados”.

Carece, pois, de toda sinceridade a assinatura do líder russo no que se refere ao “inaceitável uso de meios desleais para incitar os crentes a passarem de uma Igreja para outra, negando a sua liberdade religiosa ou as suas tradições” (nº 24).

O arcebispo-mor ucraniano observou que o nº 26, sobre a agressão russa à Ucrânia, dá “a impresso de que o patriarcado de Moscou se nega obstinadamente a admitir que é uma parte do conflito, quer dizer, que apoia abertamente a agressão da Rússia contra a Ucrânia”.



Dom Sviatoslav sublinhou que a Ucrânia sofre “uma agressão externa de um Estado fronteiriço.

“Hoje é amplamente reconhecido que se a Rússia não enviasse soldados para solo ucraniano e não lhes fornecesse armas pesadas, e que se a Igreja ortodoxa russa, em lugar de abençoar a ideia de um “Russkiy Mir” (um “mundo russo”) apoiasse a Ucrânia no esforço para consolidar as próprias fronteiras, não haveria nem anexação da Crimeia nem guerra”.

O arcebispo mostrou também a falsidade do convite de “abster-se de participar no conflito e não apoiar ulteriores desenvolvimentos do mesmo”.

Segundo ele, “lembra-me muito as acusações do metropolita Hilarion, que ataca as posições dos ‘ucranianos cismáticos e uniatas’; praticamente nos acusa de sermos nós a causa da guerra na Ucrânia oriental e, ao mesmo tempo, qualifica nossa posição cívica, baseada na doutrina social da Igreja Católica, como apoio a uma só das ‘partes que participam no conflito’”.

O chefe do rito greco-católico fez questão de sublinhar em alto e bom tom: “Nunca estivemos do lado do agressor; pelo contrário, permanecemos junto de nossa gente quando estava na Praça Maidan e quando era assassinada pelos fautores do ‘Russkiy Mir’.

“Nossos sacerdotes nunca pegaram em armas, contrariamente ao que aconteceu na outra parte.

“Hoje mais do que nunca as circunstâncias são tais, que nossa nação não tem outra proteção e refugio senão em sua Igreja. A consciência pastoral nos apela a ser a voz do povo, inclusive quando essa voz não é ouvida ou é ignorada pelos líderes religiosos das Igrejas de hoje em dia.

“Sem dúvida, este texto causou uma profunda decepção entre muitos fiéis da nossa Igreja e entre os cidadãos conscienciosos da Ucrânia. Muitos entraram em contato comigo e me disseram que se sentem traídos pelo Vaticano.

“Compreendo certamente esses sentimentos, prosseguiu. Sem embargo, encorajo nossos fiéis a não dramatizar essa declaração e a não exagerar sua importância para a vida da Igreja. Temos experimentado declarações similares e sobreviveremos também a esta.

“Nossa unidade e plena comunhão com o Santo Padre, o sucessor de Pedro, não é o resultado de um acordo político ou de um compromisso diplomático. Essa unidade e comunhão com o Pedro de hoje é uma questão de fé.

“Ao Papa Francisco e a cada um de nós, Cristo, no Evangelho de Lucas, diz: ‘Simão, Simão! Eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como o trigo; mas eu roguei por ti, para que a tua confiança não desfaleça; e tu, por tua vez, confirma os teus irmãos’.

“É por esta unidade com a Sé Apostólica que deram suas vidas, no século XX, os mártires e os confessores da fé de nossa Igreja, selando-a com seu sangue. Esta pedra de Cristo o Senhor a converterá na pedra angular do futuro de todos os cristãos. E será ‘uma maravilha para nossos olhos’”.

Por sua vez, o Núncio vaticano em Kiev, arcebispo Claudio Gugerotti, embora seja tido como um diplomata da linha da Ostpolitik favorável à aproximação com o comunismo, falou em 13 de fevereiro em Kiev, um dia após o encontro na ilha-prisão, registrou o vaticanista Sandro Magister.

O Núncio reconheceu que existe uma voz corrente no país: “Mas também Judas beijou Jesus e no fim o traiu”. E acrescentou “que muitos sofreram nestes dias por muitas razões”. Ele pediu aos fiéis para esquecerem o Documento de Havana.

Myroslav Marynovych, vice-reitor da Universidade Católica de Lviv, Ucrânia: o Documento não é mais do que um passa-moleque moscovita
Myroslav Marynovych, vice-reitor
da Universidade Católica de Lviv, Ucrânia:
o Documento não é mais do que um passa-moleque moscovita
Myroslav Marynovych, vice-reitor da Universidade Católica de Lviv, cofundador de Anistia Internacional Ucrânia, membro fundador do Ukrainian Helsinki Group e ex prisioneiro político, destacou que a diplomacia vaticana tal vez esteja cantando vitória, noticiou a agência Euromaidanpress.

Mas pessoas como ele, educadas na duplicidade da ideologia comunista e curadas pelo espanto com o cinismo da ideologia do “mundo russo”, não caem no jogo das palavras. Para tais pessoas, o Documento não é mais do que um passa-moleque moscovita.

Segundo o vice-reitor, fica claro que os parágrafos relativos à Ucrânia foram redigidos no Kremlin, pois eles repetem literalmente surrados slogans sobre o “conflito” e os católicos “uniatas” são menosprezados como “cismáticos”.

Não há uma palavra sequer sobre o envolvimento da Rússia na guerra. Este ponto foi exigido pelo metropolita Hilarion e foi aceito pela diplomacia vaticana, até eventualmente pelo Papa.

Segundo o vice-reitor da Universidade Católica, no desejo de não irritar Moscou, o Vaticano acabou dando luz verde à perseguição contra Igreja Católica na Criméia, à destruição física dos pastores protestantes, à perseguição aos cismáticos dissidentes do patriarcado de Moscou, aos grupos que denunciam a violação maciça dos direitos humanos nos territórios ocupados pela Rússia e até à minoria étnica tártara da Crimeia.

Por isso, conclui, a diplomacia vaticana “pôs de lado a verdade em benefício de um efêmero ‘dialogo com Moscou’”.

“A Declaração de Cuba é uma inegável vitória do Kremlin e da polícia política FSB, agindo conjuntamente com seus obedientes súditos da Igreja Ortodoxa Russa”.


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2 comentários:

  1. A Crimeia pertence a Rússia, sempre pertenceu, e o Putin não é pior que a dominação da plutocracia Americana.

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  2. Mau argumento, Anônimo: autorizar a injustiça e a insanidade invocando injustiças e insanidade de outrem. Essa é a marca dos partidários do erro, não de quem busca a verdade e a justiça.

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