domingo, 2 de agosto de 2020

Democracia de Putin: cárcere para quem o derrota nas urnas

Khabarovsk indignada pela prisão do governador que ela escolheu
Khabarovsk indignada pela prisão do governador que ela escolheu
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs






Como foi anunciado antes, durante e depois do referendo, o povo russo aprovou a nova Constituição que porá Vladimir Putin mais outras vezes no poder absoluto até 2036.

A esmagadora votação popular obedeceu ao pé da letra as proporções desejadas pela Comissão Eleitoral Central (77,9% de votos a favor).

Também obedeceram à lógica democrática russa as cômicas irregularidades nas locais de eleição.

Essas, filmadas pelas câmeras de segurança, exibiram funcionários introduzindo maços de votos nas urnas, como já se viu em eleições anteriores.

Os casos mais escandalosos, dignos de filmes dos três patetas, foram anulados.

A popularidade de Putin está em seu mínimo histórico. Ele enfrenta um crescente descontentamento social, escreveu “El País”.

Para aglutinar simpatias Putin apela para o nacionalismo militarista agressivo para defender o país de uma mal explicada conspiração capitalista planetária.

E ele se apresenta como como o gigante Adamastor que se ergue contra essa trama, distribuindo até cifras milionárias no exterior a movimentos "companheiros de estrada" enquanto a sociedade russa está exausta e a economia padece aguda crise.



Pelos milagres da democracia e do ex-agente da KGB, na manhã da votação as sofridas famílias russas encontraram um dinheirinho extra nas suas contas bancárias.

Porém, o futuro é turvo: em Nijni Novgorod, 40,3% votaram contra; em Moscou, 37,67% optaram pelo não.

'Estamos contra o governo de Putin' foi brado da multidão em Khabarovsk.
'Estamos contra o governo de Putin' foi brado da multidão em Khabarovsk.
Turbulências virão apesar de a oposição estar esmagada e os partidos que não afinam com o chefe supremo não duram muito.

A fórmula de Putin também é velha conhecida das ditaduras: controle dos meios de comunicação, máquina de propaganda poderosa, repressão dos movimentos sociais. A novidade reside nas restrições de reunião aduzidas pelo coronavírus.

Pelo mesmo argumento as campanhas tiveram que ser feitas online, através dos canais que na quase totalidade pertencem a Putin.

Ai dos blogueiros anti-Putin, rezemos por eles.

O Partido Comunista russo, que se diz continuador do velho PC da URSS, se mostrou contrário à reforma. Ele faz oposição na Duma mas, nas horas certas, com o auxílio de verbas decide pelo partido do Governo.

Seu líder Guenady Ziuganov afirma que “Putin tem agora mais poder que um czar, um faraó e um secretário-geral [do Partido Comunista da URSS] juntos”.

Ziuganov também acha suspeita a transparência do processo de votação que julgou muito difícil de controlar de forma independente. Mas disto todo mundo já sabia.


Fraudes capturadas pelo monitoramento anti-fraude russo. CLIQUE NA FOTO
(o vídeo é de 2018, mas é apresentado como fiel ilustração do que aconteceu em 2020)



A cozinha eleitoral já está causando problemas a Serguei Furgal, o governador da região de Khabarovsk, no extremo leste da Rússia, cuja capital homônima tem aproximadamente 600 mil habitantes, informou “GauchaZH”.

Após o referendo, o governador foi preso acusado de assassinatos e levado a Moscou, onde aguarda julgamento.

Seu pior crime, entretanto, foi em 2018: ele derrotou com quase70% dos votos o candidato da legenda Rússia Unida, que é do presidente.

Furgal, do ultranacionalista Partido Liberal Democrata Russo – a segunda força de oposição no país – é um dos poucos governadores não ligados totalmente ao Kremlin.

Ele pode vir a ser condenado a prisão perpétua e nega as acusações.

Manifestantes pedem a libertação do governador de Khabarovsk
Manifestantes pedem a libertação do governador de Khabarovsk
O suspeito procedimento de Moscou motivou protestos pacíficos que lotaram a rua principal da capital regional.

Os manifestantes pediam um julgamento transparente, de preferência na própria cidade de Khabarovsk, perto da China, e não em Moscou que fica a mais de 6.000 km.

Os cartazes e gritos de ordem também passavam mensagens anti-Putin.

A mídia local contou entre 15 mil e 30 mil cidadãos no protesto, enquanto o Ministério do Interior diminuiu drasticamente a estimativa. Outras cidades da região tiveram manifestações menores.

Svetlana, mulher de meia-idade usando uma máscara, disse que os moradores não foram abalados pelas acusações contra Furgal. Muitos políticos russos têm um passado sombrio, disse ela, porque os últimos anos da União Soviética foram cheios de corrupção e crimes.

“As pessoas vieram defender o direito ao voto. Nós o elegemos, então devolva-o para nós”, disse ela, segundo referiu a agência Reuters.

Passeata contra Putin em Khabarovsk



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