Policia secreta russa reprime dissidentes tártaros. |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
A população tártara da Crimeia está indignada com a opressão que sofre por parte dos invasores russos de sua terra.
A tensão atingiu mais um patamar quando a Procuradora Geral da península, Natalia Poklonskaïa, suspendeu a Assembleia dos Tártaros, ou Medjlis, acusando-a falsamente de praticar “atividades extremistas” e de trabalhar pela “desestabilização”, escreveu o jornal parisiense “Libération”.
O Medjlis é o órgão representativo da população tártara da Crimeia. Os tártaros são um povo muçulmano de etnia turca que fizeram parte das hordas mongólicas que invadiram e devastaram o mundo eslavo entre os séculos XV e XVIII.
Após essas guerras, os tártaros se fixaram na Crimeia, dedicando-se à agricultura e ao artesanato, adotaram muitas formas da cultura ocidental e passaram a viver em paz com a população local, preservando a nostalgia de suas raízes históricas.
Os tártaros da Crimeia resistiram à revolução bolchevique, até que o regime comunista empreendeu uma sanguinária perseguição contra eles, coletivizando suas terras com a reforma agrária e dizimando-os nas Grandes Purgas dos anos 1930.
Uma geração inteira de homens de elite, políticos e intelectuais tártaros famosos foi massacrada pelo comunismo com falsas acusações.
A partir de maio de 1944, a população começou a ser deportada em massa para a Ásia Central por ordem de Stalin. Muitíssimos morreram neste exílio despótico.
Porém, quando em 1991 caiu a URSS, mais de 250.000 sobreviventes decidiram voltar à terra de seus antepassados e constituem hoje 12% da população da península.
Os tártaros da Crimeia logo manifestaram seu repúdio à invasão russa de 2014 e apoiaram a Ucrânia. 70% deles se abstiveram no referendo que coonestou fraudulentamente a anexação da península à Rússia.
Tártaros da Crimeia protestam com bandeiras ucranianas, além da própria. |
Agora a Procuradora Natalia Poklonskaïa declarou que a menção ao Medjlis está “proibida em todos os órgãos da mídia estaduais e municipais”, e que ele “fica proibido de organizar reuniões, fazer uso de contas bancárias e realizar qualquer espécie de atividade”.
A ditatorial decisão permanecerá em vigor até o acórdão do tribunal que vai proceder à proibição definitiva, acrescentou o jornal parisiense.
O governo russo acusa o Medjlis de ser responsável pelo bloqueio alimentar e energético da Crimeia. De fato, militantes tártaros e ucranianos bloquearam a passagem dos caminhões que vinham da Ucrânia e fizeram voar pelos ares as linhas de alta tensão, deixando a península na escuridão e no frio.
Os chefes russos locais acusam Renat Tchoubarov e Mustafa Djemilev, deputado no Parlamento ucraniano e líder histórico dos tártaros da Crimeia, de serem os principais culpados. Os dois estão exilados.
O atrito é muito importante porque a Rússia se revelou incapaz de sustentar as necessidades básicas do povo da Crimeia e até de lhe fornecer energia elétrica, embora oficialmente a península agora faça parte da Rússia.
Reunião de Tártaros da Crimeia nas montanhas de Chatyr-Dag, perto de Alushta, para comemorar o 71º aniversário da deportação em massa feita pelo comunismo russo. |
Porém, a Rússia fechou a única rede de TV em língua tártara, a ATR, o ensino nessa língua local foi drasticamente reduzido e os tártaros ficaram proibidos de se reunir na capital, Simferopol, até para comemorar a deportação estalinista.
Os tártaros se viram logo reforçados na ideia da duplicidade maquiavélica de Moscou, acentuada pela lembrança dos massacres comunistas do passado.
O Medjlis representa os tártaros desde 1991, mantém bom relacionamento com a Ucrânia e é detestado pela despótica “nova Rússia” de Vladimir Putin.
Para Amnesty International, a decisão da Procuradoria visa “afogar qualquer dissidência” e “suprimir um dos últimos direitos de uma minoria que a Rússia deveria proteger em lugar de perseguir”.
Desde o golpe russo de 2014 seis membros da comunidade tártara desapareceram, tendo um deles sido encontrado morto no mesmo ano de 2014.
Nenhum comentário:
Postar um comentário