A Ucrânia revelou que Paul Manafort, “homem forte” da campanha republicana, agia a serviço do “mundo russo”. Manafort renunciou e Trump prometeu moderação. |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
Adormecidos pela ilusão da “morte do comunismo”, muitos americanos acordaram surpresos descobrindo até que ponto as antigas redes de influência soviética estavam agindo na eleição presidencial de seu país.
Uma catarata de denúncias, confissões e interferências russas irrompeu na campanha eleitoral para escolher o próximo presidente na votação de 8 de novembro.
O caso mais clamoroso foi protagonizado por Paul Manafort, o “homem forte” da campanha do candidato republicano Trump.
Manafort acabou renunciando após vir à luz inquérito publicado na Ucrânia dando conta de que ele recebeu muitos milhões de dólares do então presidente ucraniano pró-russo Yanukovitch para obter apoios de políticos em Washington e para que grandes meios de imprensa americanos divulgassem notícias contrárias aos ucranianos anti-russos, informou o jornal “Clarín”, de Buenos Aires.
Paul Manafort já havia sido denunciado pelo seu trabalho de lobby em favor da Rússia em Washington, mas ele negou com ares inocentes.
O relatório ucraniano foi irrefutável e revelou que Manafort agia a serviço do “mundo russo” fiel a Viktor Yanukovitch, o ex-ditador pró-Kremlin que fugiu da Ucrânia e hoje está refugiado na Rússia. Manafort teve que renunciar e foi substituído com promessa de moderação de discurso.
Outra rumorosa revelação focou Carter Page, assessor de política externa do candidato Donald Trump.
Page fizera uma palestra sobre “a evolução da economia mundial” na Nova Escola de Economia de Moscou.
Nela, ele fugiu de modo infeliz aos questionamentos sobre as ligações entre Trump e a Rússia de Putin, segundo circunstanciada reportagem do “Le Monde” de Paris reproduzida pela UOL.
Carter Page ajudou a restabelecer o dirigismo econômico nas mãos do Kremlin |
Page já trabalhou em Moscou para o banco de investimentos americano Merril Lynch. Ali assessorou, entre outros, a gigante do petróleo Gazprom em uma de suas maiores operações financeiras: a compra por US$ 7,4 bilhões do Sakhalin 2, um campo de hidrocarbonetos no mar de Okhotsk, que pertencera à Shell.
A operação contribuiu para Putin restabelecer o controle do Kremlin sobre a Gazprom, que havia sido parcialmente privatizada nos anos 1990.
Richard Burt, outro assessor contratado para a equipe de Trump, vinha formulando posicionamentos críticos à NATO. Em circunstanciado artigo, a revista “Slate” descreveu-o como “a marionete de Putin”.
Também entrou nesse grupo de assessores Felix Sater, judeu russo imigrante hoje com problemas com a Justiça americana por suas supostas ligações com a máfia.
“The Washington Post” descreveu a chegada de Sater à órbita do magnata candidato através de sua empresa Bayrock Group, sediada na Trump Tower.
“Documentos provam que Trump, em 2005, fechou um contrato de um ano com o Bayrock Group para desenvolver um projeto na capital russa”, escreveu o jornal.
Grandes negócios ou relacionamentos continuados não foram, porém, as piores surpresas da interferência do Kremlin na política interna americana.
O hackeamento do Comitê Nacional do Partido Democrata e da Fundação Clinton, feito a partir da Rússia, constituiu um atentado à segurança americana como talvez nunca tenha havido, ou se houve nunca foi confessado.
A empresa de cibersegurança CrowdStrike revelou que os hackers russos visaram dados sobre Trump. Como de praxe, o Kremlin negou o envolvimento nos casos de espionagem e fez aparecer um “laranja” que atende pelo pseudônimo de “Guccifer 2.0”.
Num desdobramento do caso, Trump convidou o serviço secreto russo a interferir mais nos e-mails do partido rival. O que o ex-secretário de Defesa e diretor da CIA, Leon Panetta, achou inadmissível:
“Nenhum candidato que está concorrendo para presidente do EUA deveria pedir a um país estrangeiro, especialmente à Rússia, que se envolva em invasão digital ou em esforços de inteligência para tentar determinar o que o candidato democrata está ou não fazendo”, disse.
Estudante aguarda comício de Trump na Plymouth State University, Plymouth, NH. |
“Vocês acham que o Putin virá?” – perguntou. “E se vier, será que ele vai se tornar o meu novo melhor amigo?”
Trump tinha ficado deslumbrado com a perspectiva de lucrativos contratos para a construção de hotéis de luxo na Rússia. Como Putin tem o costume de fazer promessas mirabolantes a grandes capitalistas ocidentais para depois não cumprir, Trump ficou a ver navios.
Através da mídia, Putin exprimiu amabilidades dirigidas a Trump. E foram criados dois websites em russo para promover a candidatura de Trump.
“Um homem forte”, disse o americano do déspota russo. “Um homem brilhante e notável”, devolveu maquiavelicamente Putin, garantindo que o Kremlin colaboraria até com a candidata democrata que também lhe oferecerá substanciosos lucros políticos.
Garry Kasparov: Putin conseguiu assustadora influência |
Para ele, é como se Putin tivesse conseguido instalar na testa do partido do qual se aguardam as melhores posições uma pessoa que põe em prática os artifícios de medo e de ódio com que o líder russo governa o país.
Apesar de diferenças que impedem uma simplificação, segundo Kasparov, Putin comemoraria no estilo de Trump os métodos que o mantém há 16 anos na chefia da Rússia.
Kasparov escrevia de Tallinn, capital da Estônia, que sem a NATO os “subúrbios” engrossariam, no dizer de Newt Gingrich, admirador do candidato republicano e quase eleito para integrar sua chapa como candidato a vice. Putin obteve um amigo na sua cruzada contra a NATO, algo impensável nos tempos da Guerra Fria, acrescentou.
Kasparov também ficou horrorizado com as omissões e ambiguidades do candidato, que beneficiaram a política de Putin na Síria.
Segundo presidente da Fundação pelos direitos humanos, as forças russas no Oriente Médio estão fazendo massacres que objetivamente criarão milhões de refugiados que vão despencar sobre a Europa sem causar danos relevantes aos jihadistas.
O “The New York Times” talvez sarcasticamente, apontou a existência do que denominou a “Putin-Trump Admiration Society”.
Ele se referia à troca de cumprimentos e elogios entre os dois políticos no último ano.
Nada há de novo em que os serviços de inteligência dos dois países estejam em continuado assédio. O que é inteiramente novo é que a espionagem cibernética russa esteja trabalhando para favorecer um candidato americano à presidência.
Após solicitar a intervenção russa nos computadores do partido democrata, Trump correu para remediar a gafe dizendo que era uma brincadeira.
Mas há coisas com as quais não se brinca, e neste caso o destino do mundo está em jogo.
O desinteresse pelos países aliados que integram a NATO serve incontestavelmente ao sonho de Putin de restaurar a Rússia como um superpoder.
O jornal também montou um vídeo onde recolhe imagens e frases de encômio de um ao outro e as semelhanças entre ambos. Veja:
Em 1989, quem teria dito que a KGB ousaria tanto?
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Naquele ambiente, como seria recebido alguém que insinuasse, ainda que em brincadeira, que o mesmo ex-agente da KGB agiria no mais intimo das eleições presidenciais americanas?
E se ele fez isso nos EUA, não estará manipulando suas redes de influência em sentido análogo em outros países que não caíram, até momento ao menos, sob a batuta do ditador do Kremlin?
Entretanto, coube a um brasileiro a honra de denunciar que por detrás da suposta “morte do comunismo” se havia montado um processo de metamorfose desse mesmo comunismo, o qual viria a se manifestar no futuro, pegando o mundo ocidental de surpresa.
“Em 9 de novembro de 1989 caiu o muro de Berlim. No dia 10 de julho de 1991, depois de a Lituânia se proclamar independente, foi decidida a autodissolução do Pacto de Varsóvia.
“A falência do putsch de 19 de agosto de 1991 levou à queda de Gorbachev, substituído por Boris Iéltsin, e a uma cascata de declarações de independência dos países bálticos e demais repúblicas soviéticas.
“Estes acontecimentos espetaculares, habilmente propagandeados pela mídia, confirmaram oficialmente a queda dos regimes comunistas instaurados na Europa Oriental a partir da Revolução de Outubro, e patentearam o colapso do assim chamado ‘socialismo real’.
“Tal mudança, que se desenvolveu no interior da nomenklatura soviética e se realizou de modo aparentemente incoerente, quase sem reações violentas, insurreições ou revoltas, foi interpretada por Plinio como uma metamorfose do marxismo, em estrita coerência revolucionária com o princípio marxista-leninista da ‘filosofia da práxis’.”
(Roberto de Mattei, “Plinio Corrêa de Oliveira – Profeta do Reino de Maria”, Artpress, São Paulo, 2015, p. 336-337).
Essa foi a invariável denúncia do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, que infelizmente não foi ouvida na época com a devida atenção.
Agora, essa “metamorfose do comunismo” emerge infiltrada no interior dos setores mais dignos de respeito do país detentor do maior sistema de contraespionagem do mundo ocidental!
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