segunda-feira, 8 de junho de 2020

Referendo combinado fará de Putin um omniarca

Capa do The Economist de 2016 procurava discernir o enigma do putinismo ascendente.
Capa do The Economist de 2016 procurava discernir
o enigma do putinismo ascendente.
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs







A revista britânica The Economist, a mais prestigiada no âmbito econômico, destacou o gosto de Vladimir Putin em confundir os outros.

Como ex-agente da KGB, diz a revista, ele se sente à vontade agindo na penumbra, sobretudo quando burla a lei. É o que viria fazendo desde o anúncio das mudanças constitucionais para mantê-lo no poder até 2036.

Pela atual Constituição deveria deixar a presidência em 2024, mas ele não tem a menor intenção de fazê-lo, diz o Economist.

Em 6 de março último prometeu que não repetiria a gerontocracia – governo oligárquico dos mais velhos – soviética, mas quatro dias depois, avisou exatamente o contrário à submissa Duma (Legislativo) que aprovou a reforma que o manterá no poder absoluto até atingir 83 anos de idade.



As declarações de Putin foram sombrias, segundo The Economist, e as emendas à Constituição são confusas e contraditórias. O objetivo, porém, é um só: Putin ficar com o poder absoluto reduzindo, a nada ou quase tanto, a autoridade dos eleitos e das normas internacionais.

A Duma aprovou a vontade da omniarquia –poderes totais – de Putin no sexto aniversário da anexação ilegal da Crimeia. E o Tribunal Constitucional, controlado por ele, também o confirmou e aguarda-se que ele seja feito pelo povo russo num referendo ‘fabricado’.

O referendo devia ocorrer no 150º aniversário do nascimento do fundador da URSS, Vladimir Lenin, mas foi remarcado para o dia 1º de julho, pois a epidemia segue fazendo horríveis estragos por lá.

Vladimir Putin tem modelos para escolher. Na foto com o ditador da Coreia do Norte
Vladimir Putin tem modelos para escolher.
Na foto com o ditador da Coreia do Norte
Para The Economist não terá conteúdo democrático, mas será apresentada como consentimento popular sem base na lei russa, envolvendo algum espetáculo televisionado.

Temendo manifestações da oposição, as assembleias públicas foram proibidas, sob o argumento da pandemia do coronavírus.

Para “El Mundo” de Madri, a nova Constituição apresenta como fachada um “coquetel conservador” que põe a ênfase em Deus, na família e na anexação ilegal da Crimeia.

Mas no interior do texto constitucional, a Federação Russa é proclamada sucessora legal da União Soviética, além de declarar “inaceitável” o “revisionismo histórico”, como por exemplo, relembrar o Pacto Ribbentrop Molotov de aliança entre Hitler e Stalin, a invasão conjunta da Polônia, entre outros.

Declara ainda ilegal qualquer concessão, ainda que meramente verbal, a respeito dos territórios que a Rússia acha seus, como a Criméia arrebatada à Ucrânia, as ilhas Curilas reclamadas ao Japão, e o retorno do Estado de Alaska, vendido no século XIX aos EUA.

A ambiguidade geral foi planejada e servirá para a interpretação do próprio Putin segundo as suas conveniências.

Ele não poderia mais ser presidente, mas ficaria com a chefia de um Conselho de Estado e de Segurança reforçados, que fazem do presidente da Federação um boneco em suas mãos.


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